segunda-feira, 1 de setembro de 2014

esqueci de te contar

enquanto eu olhava pro vazio
pro só e pro entre
e rabiscava a tela do computador
com sal de lágrima

aconteciam coisas aqui

esqueci de te contar
deve ter sido a correria, o calor, o frio, o trabalho, o telefone que quebrou
deve ter sido a falta
de foco, de tempo, ou a falta de amor, de compromisso, de vergonha na cara, de...

ou deve ter sido o excesso
de trabalho, de carro, de barulho, de louça suja, de gente, de desejo, de planos bagunçados, de expectativas, de opinião, de trabalho, de trabalho, de trabalho...

enfim, esqueci, esqueci

mas, olha, aconteciam mesmo coisas aqui

e eram lindas

acontecia gente fazendo malabarismo com a vida, no farol e na varanda, como se ela fosse boa no fim das contas. aconteciam mulheres autônomas e incríveis educando filhos educadores. aconteciam amigas curando com florais, com olhares, com sopa de legumes, com sambas no bexiga. aconteciam mergulhos no fim do mundo pra encontrar o encanto das histórias que vale a pena escutar até dar tontura. acontecia o amor desenhado com os dedos no ar, no corpo, no espelho do banheiro, no vidro do busão, enquanto plantas improváveis floresciam nos quintais ou dentro das jarras de água. acontecia até tartarugas nadando dentro do metrô. acontecia cheiro de vick e lembranças de vó. aconteciam mulheres de 100 anos aconselhando loucuras. aconteciam parcerias de vida inteira transformadas e reafirmadas em olhares e silêncios tagarelas no meio da multidão. aconteciam dias de sol em que o próprio sol pedalava pela cidade, sorridente, entre barbas. aconteciam escaladas em amoreiras gigantes em que era possível olhar o mundo do alto dos 7 anos e entender tudo como se fosse simples.

além da dor, do ladinho dela, aconteciam muitas coisas por aqui.
e elas eram assim absurdamente, doidamente lindas e felizes.
desculpa, esqueci de te contar.

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