domingo, 8 de dezembro de 2013

Escritos de um domingo de trabalho

a ser
Se eu explodisse
E esse vazio barulhento de dentro
Virasse labareda sem controle

Queimaria
preguiça, mentira, frescura
mesquinhez e bom comportamento

Queimaria
piscina de mansão, fazenda de escravidão
culpados, covardes, cansados

Queimaria limites
E, cheia dos cacos que sobrassem,
a realidade seria, de novo, uma só
indescritível. a ser.


***

Tatuagem
Ele tinha uma cicatriz
se confundia com a costela
era porta de entrada do pulmão
como se o ar pudesse entrar nele por ela

Ele tinha uma cicatriz
e dela não dava pra ver começo nem fim
Dali do meio do tronco
ramificava nele todo - musgo

Ele tinha uma cicatriz
em vez de roupa, comida, sonho, dentes
Um desenho quase bonito-de-feio
Tatuagem de misérias

Ele tinha uma cicatriz
que se mostrava mais que os olhos,
mais que a roupa rasgado e o descalço dos pés,
mais que sua humanidade até.

Ele era a cicatriz
movendo-se entre carros sem ninguém dentro.

***

Queria escrever uma palavra
violente e acolhedora
como o calor

Queria arrancar seus olhos, os pulmões e as pernas
pra você entender direito o que é ser livre

Queria filmar dentro de você
- uma câmera documental -
pra achar onde é o espaço do outro

Queria transplantar as lágrimas todas
trocar as de uns com as de outros
pra só sobrarem as banais.

Porque os motivos de existência das lágrimas justas
virariam chuva

ácida

derretendo-nos todos
a partir da geolocalização
das nossas injustiças acumuladas

Eu queria escrever uma palavra de revolta
mas esses dias só tem saído água da ponta da caneta azul.

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